
A afirmação é de Orlando Castro, jornalista, escritor e Director Adjunto do Jornal Folha 8 feita no programa Mar de Letras da RTP-ÁFRICA emitido ontem quarta-feira, 15 de Abril de 2020. Que pode acompanhar na íntegra no nosso canal do YouTube: https://youtu.be/pfXCRuv_QyQ
Por José Kabangu*
Fonte: avozdecabindambembubuala.com
Por intermédio de um diálogo franco e aberto (pena que foi por pouco tempo), Orlando Castro falou das suas memórias, essas que têm o ponto de partida em Nova Lisboa a actual cidade do (Huambo) em Angola que felizmente continuam por terras lusas (em Portugal).
Memórias que descrevem a longa caminhada deste grande filho de Portugal e Angola, que hoje nos fazem perceber o porque do Jornalismo e da escrita na sua vida.
Memórias essas que também nos elucidaram que Orlando de Castro é defensor de causas antigas e duradouras como a questão do Direito à Autodeterminação do Povo de Cabinda que poderá se concretizar, segundo este, “por uma razão muito simples”, e tendo em conta “que se aplica à Cabinda como se aplica a nossa vida de uma forma geral, só é derrotado quem deixa de lutar. E eu não acredito que os Cabindas deixem de lutar e portanto eles vão ganhar essa causa quando é que não se sabe, desde logo porque ao nível do Direito Internacional Cabinda tinha o Estatuto, como sabes de Protectorado. No 25 de Abril foi anexada de uma forma um bocado atabalhoada à Angola e, passou a constituir uma província de Angola , fazendo lembrar Timor – Leste que também foi anexada e passou a ser uma província indonésia e depois deu no que deu”.
“E Cabinda tem ou os Cabindas têm a infelicidade de terem petróleo o que é complicado, todos nós sabemos que a grande percentagem de petróleo exportado por Angola vem de Cabinda, no entanto o povo de Cabinda que onde vão buscar o petróleo vive pior que em qualquer outra Província. E mesmo do ponto de vista mental, físico, linguístico os Cabindas são diferente dos angolanos, alias mesmo dentro de Angola há povos com características completamente diferentes e portanto eu contínuo a achar que de facto Cabinda não é Angola, e que mais cedo ou mais tarde essa realidade vai vingar”, conclui Orlando de Castro a visão que defende para Cabinda e os Cabindas.
Contudo, “Orlando Castro é o angolano mais Cabinda que já conheci. É alguém que vestiu a causa dos Cabindas” defendeu recentemente nas redes sociais LeoTon Mabiala. A par de William Tonet, Makuta Nkondo, Sapalo António, Brigadeiro 10 Pacotes e tantos outros angolanos que defenderam e continuam a defender as verdades históricas e Jurídicas sobre o direito à Autodeterminação do povo de Cabinda, aqui vão os nossos agradecimentos pela coragem em defenderem a verdade e a justiça, independentemente das consequências.
Orlando Castro nasceu em 1954 em Angola, na então cidade de Nova Lisboa (Huambo), o incansável defensor da verdade e da Justiça, é autor de várias obras, tendo publicado em 2011 a obra Cabinda (Ontem Protectorado, Hoje Colónia, Amanhã Nação) pela editora letras de Ferro. Leiam a seguir na íntegra a intervenção de Carlos Narciso, na apresentação do livro em Lisboa, em Maio de 2011:
“Este livro é um exercício a dois tempos. Por um lado, é um relatório de factos relacionados com a História de Cabinda. Os tratados do século XIX, a implantação da República em Portugal, o Estado Novo, a revolução de Abril, a descolonização, a guerra civil angolana. Por outro lado, é um acto de liberdade de expressão, exercido por um jornalista que se quer a tempo inteiro e íntegro.
Muitos dirão que se trata de jornalismo de causas, e porventura terão razão. Mas a defesa da causa dos oprimidos, das minorias, dos mais fracos, dos que não têm voz, é um jornalismo por uma causa justa, digamos assim, “é o jornalismo da indignação, que não é indolor nem incolor” parafraseando o conhecido jornalista português Baptista Bastos.
O que o bom jornalismo exige é a procura, em consciência, da Verdade, mais do que a simples exposição de factos ou afirmações. Fazer jornalismo é, ainda, descodificar argumentos para uma linguagem acessível a todos os que quiserem compreender o drama que se relata na prosa jornalística…
Nesse sentido, este livro é uma pedrada no charco. Não por conter revelações assombrosas, mas por se atrever a falar de um assunto silenciado e que incomoda os sistemas em vigor: o sistema político instaurado em Angola e o sistema capitalista sustentado globalmente pela exploração e acumulação de riqueza.
Aqui não resisto em repetir o que vem escrito no livro: “…é por isso que Cabinda não é notícia. Uma bitacaia no presidente do MPLA teria com certeza muito maior cobertura do que o facto de em Cabinda imperar o terror.
Falar hoje de Cabinda é algo que desagrada aos poderes políticos e económicos de Angola, de Portugal, e dos que mandam em Angola e em Portugal.
A situação de Cabinda deriva do resultado da descolonização portuguesa. Mas essa descolonização não foi um acto controlado pelos que derrubaram o regime do Estado Novo em Portugal. O papel de Portugal não foi assim tão decisivo, tendo em conta o confronto na época entre os EUA e a União Soviética.
Aconteceu que os EUA perderam a guerra em Angola, assim como já tinham perdido antes a do Vietname.
Os vencedores – a URSS, Cuba, o MPLA – não estavam, naturalmente, interessados na independência de Cabinda e Portugal pouco mais podia ser que um espectador passivo.
Bom, é isto que este livro retrata, ainda que por outras palavras e, porventura, diferentes pontos de vista.
É preciso acrescentar que hoje vivemos em sociedades proto-fascistas, no sentido em que só os poderosos é que têm direito a sobreviver. Acham exagero? Mas digam lá, então, quem é que hoje que esteja fora do arco do poder, se consegue fazer ouvir. Não me refiro a conversas de café, onde cada um fala mais ou menos alto aquilo que entende… refiro-me ao eco que opiniões divergentes têm nos grandes órgãos de comunicação social nacionais, as televisões, por exemplo… Aqui ou em Angola?… em Cabinda é quase um silêncio total, entre cortado talvez pelos gemidos dos agrilhoados… e em Portugal, enfim… por exemplo, agora vamos para eleições, mas já repararam que os debates eleitorais nas televisões são só entre os cinco grandes partidos, os que têm acento parlamentar, mandando às urtigas o direito constitucional de igualdade perante todas as candidaturas? Em Portugal, onde é que um ponto de vista que não seja do pensamento dominante se consegue fazer ouvir? Qual é o jornal nacional, a rádio ou a televisão que acolhe opiniões incómodas e as questiona? As difunde? As confronta? Qual deles é que está aqui para ouvir ideias que confrontam o Poder estabelecido em Angola, um Poder que compra com petróleo silêncios e compromissos por todo o Mundo? É neste quadro que temos de entender o silêncio mediático que envolve a questão de Cabinda.
Mas, enfim… Quando estamos convencidos da nossa razão, nunca devemos abdicar de lutar por aquilo que entendemos que é justo. O que a História ensina é que pode demorar tempo, pode não ser no nosso tempo, pode ser que só aconteça no tempo dos nossos filhos ou dos nossos netos – digamos que isso é pouco importante. O que é importante é o rumo que imprimimos aos acontecimentos. O livro termina com a frase “Só é derrotado quem deixa de lutar”… na verdade, a razão pode ser abafada durante algum tempo, mas não pode ser abafada durante todo o tempo. É isso que este livro nos ensina. E por isso merece ser lido.
Obrigado, Orlando Castro”.
*Coordenador da MBEMBU BUALA PRESS ( A VOZ DE CABINDA)
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